quarta-feira, 9 de maio de 2012

A Justiça Acuada Entre Os Direitos Básicos e os Direitos Pagos


Lei se cumpre não se discute. Este é um axioma jurídico que pode sim ser discutido, quando uma sentença judicial de interesse comercial ou financeiro colide com os interesses básicos de um cidadão, como direito ao trabalho, a saúde e a vida.
O direito não é uma matéria concreta. Tudo depende de interpretações de artigos e incisos que estão postulados friamente na Carta Magna e nos compêndios de códigos jurídicos, sempre abertos e em constante evolução e mutação.
Alguns direitos são mais básicos que outros, e alguns preceitos jurídicos são sobrepujados por outros, quando um julgador, se valendo do bom senso e da inteligência dos artigos profere sentença em total oposição à interpretação literal e autocrática da lei.
A lei proferida gera por si uma nova interpretação que remete a discussão para uma esfera superior até que, algum tribunal supremo, ou por decisão direta ou por sumula vinculante estabelece finalmente o top da verdade jurídica.
E nem esta verdade pode ser considerada absoluta e definitiva, quando novos elementos e novas interpretações podem levar este mesmo tribunal à reforma da sentença anterior.
Vamos supor, por mero exemplo, que uma pessoa movida pela fome subtrai de uma quitanda uma abóbora. Tecnicamente ela cometeu roubo, e algum juiz excessivamente conservador pode lhe sentenciar a prisão.
O mesmo Estado que preceitua o direto básico a vida, ao trabalho, a saúde, a educação, pode emitir sentença que atenta contra todos os princípios de bom senso e humanidade.
Ao delegado do caso não restará alternativa, a não ser fazer valer o cumprimento da lei, até que outra sentença, mais na frente, reforme a primeira.
Outro exemplo é o do taxista, ou outro profissional que dependa de veiculo para trabalho e sustento da família. A lei diz que quem não pagou deve ser punido. Mas diz também que existem bens que não podem ser penhorados por servirem ao cumprimento de direitos mais básicos do cidadão, do que contratos comutativos com bancos e financeiras.
O banco tem direito de fazer valer seus direitos, mas o cidadão tem mais direito de manter seu trabalho, sua dignidade e sua integridade.
Para uma justiça assoberbada, muitas vezes estes direitos se colidem, e a lei que prevalece é a de quem pode pagar mais e falar mais alto.
Porque os direitos, mesmo os básicos, não são pontos pacíficos perante a lei. O comerciante pode, diante da justiça, fazer valer seus direitos ao lucro, contra um ladrão de abóboras que não tem conhecimento e nem voz para se defender e muito menos lembrar ao juiz sobre a tese do roubo famélico. Só um advogado ou defensor público poderia fazê-lo com a devida competência.
O advogado está fora do seu alcance, (financeiro) e o defensor público estará muitas vezes atuando sem total convicção e interesse, de olho em resultados de concursos.
E o profissional autônomo que tem num veiculo a garantia de seu trabalho pode ceder este direito básico em favor dos lucros bancários ou comerciais por sentença de juiz que aplica friamente os ditames da lei. (Existem outras formas de penhora de veículos de trabalho e isto é tema para outro artigo).
Cada vez mais a justiça paga e mantida pelo fluxo arrecadatório do Estado contra as camadas produtivas, ou pelo poder financial de cunho privado, se afasta dos seus preceitos mais singelos e básicos de caráter protetivo e defensivo do cidadão.
 A justiça paga, representada por delegações cartoriais se adianta com mais rapidez e avidez, e tem no poder financeiro maior capacidade de torque da engrenagem judicial.
Vivemos diante de algumas verdades cruéis no sistema capitalista. Os interesses regrados a dinheiro podem fazer valer seus direitos legais de forma muito mais enfática e rápida do que os daqueles que, pelo menos em tese, deveriam contar com maior proteção estatal e legal.
O ponto de reequilibro entre uma justiça autofágica e catatônica e uma sociedade marginalizada e sem voz, é a imprensa livre. Ela é capaz de destacar os descalabros e absurdos gerados na estufa judicial e expor para a opinião publica, (entidade subjetiva e impessoal da trama social), uma verdade mais pura e singela que se encontra tolhida e engasgada, sob peso de verdades induzidas a peso de ouro ou de soldo.
Quando os direitos se colidem e não encontram resguardo equilibrado no sistema legal resta ao cidadão escancarar sua verdade nos parlatórios modernos, e fazer valer sua voz e seus direitos acima do ruído ensurdecedor que submete a justiça aos mandos e desmandos de quem pode pagar mais.


João Drummond









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