terça-feira, 21 de junho de 2011

Battisti e Seu Bando

De Carta Capital

Wálter Maierovitch


Um livro desmonta a versão de que o assassino foi vítima da delação de um único companheiro premiado com a liberdade

O partido democrático (PD), de oposição ao premier Silvio Berlusconi, está realizando em Roma a festa pelos 150 anos da Unificação da Itália. Pelo enorme recinto, defronte às ruínas das Termas de Caracalla, circulam ex-líderes comunistas, por exemplo, o presidente Giorgio Napolitano e Massimo D’Alema, primeiro comunista a tornar-se chefe de governo e, depois, ministro das Relações Exteriores. Os velhos integrantes e simpatizantes do eurocomunismo italiano são favoráveis à extradição de Cesare Battisti. Na festa, coube ao escritor Angelo Conti lembrar que, no Parlamento italiano, o PD votou, pela primeira e única vez, com o berlusconiano partido Popolo della Libertá (PDL). Isso para referendar a moção de desagrado com a concessão, pelo então ministro brasileiro da Justiça, Tarso Genro, do status de refugiado ao pluriassassino Cesare Battisti.

Giuseppe Cruciani, que esta semana lançou, pela editora Sperling-Kupfer, um livro sobre os amigos de Battisti e para identificar quem o protege, avisa que Roberto Saviano, autor do best seller Gomorra, acabou de retirar a sua assinatura, aposta anos atrás e quando não era conhecido, um manifesto, em sítio de organização não governamental francesa, a favor da não extradição de Battisti da França. Retirou, pois assinou “a pedido de amigos e sem conhecer nada do personagem em questão”. Saviano agora se solidariza com as vítimas de Battisti, frisa o jornalista Cruciani. Aliás, como fez também Carla Bruni, a primeira-dama da França, italiana de nascimento.

Em entrevista a CartaCapital, D’Alema lembrou-se do líder metalúrgico italiano Guido Rossa, comparado ao Lula da época de São Bernardo do Campo. Membro do então Partido Comunista Italiano (PCI), Rossa foi fuzilado pela organização marxista Prima Linea, que, num Estado democrático, dedicava-se à luta armada. A Prima Linea abrigou egressos do Proletários Armados para o Comunismo (PAC), do qual Battisti era expoente e, com Claudio Lavazza e Giuseppe Memeo, comandava as operações de sangue: matar ou aleijar os “inimigos do proletariado”, os quais chamavam, em volantes encaminhados à imprensa depois dos assassinatos, de “porcos”.

Sobre Battisti, comentava-se na festa do PD, aproxima-se o momento reservado à decisão presidencial a respeito da extradição. E que no Brasil no momento, sustenta-se mais uma mentira, ou seja, que Battisti foi condenado na Itália apenas com base no relato de Pietro Mutti, delator premiado com a liberdade. Recente artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, da lavra do advogado de Battisti, repete essa tese já esposada e proclamada por Tarso Genro.

Ninguém ousou afirmar, nem por enquanto o ex-ministro, que o assassinato de Martin Luther King foi um crime político, a ser considerado como tal pela Justiça. No entanto, no caso de Battisti, um sanguinário covarde que pretendeu, com cerca de 30 pessoas associadas, a começar pela Lombardia e Veneto, derrubar a democracia italiana e impedir que os eurocomunistas chegassem ao poder, do qual estavam a um passo, matar é ato tido como legítimo por certos praticantes do compadrio à francesa.

Uma visita aos milhares de folhas dos autos dos processos criminais sobre Cesare Battisti e membros do PAC revela o grau de caradurismo da campanha de desinformação promovida a favor de Battisti. Mais de 60 juízes, entre togados e jurados, analisaram e decidiram ao longo dos processos. Com relação a Battisti, todas as instâncias foram acionadas, incluída a Corte de Cassação e a Corte de Direitos Humanos da União Europeia sediada em Estrasburgo: a Corte de Estrasburgo entendeu que Battisti, embora foragido, estava muito bem representado por seus advogados, em todas as audiências e atos processuais.

Sobre as mortes, revelam os autos ter sido Battisti o executor material de dois homicídios qualificados pela surpresa, isto é, a impedir a reação das vítimas Antonio Santoro (chefe dos carcereiros de Udine) e Andrea Campagna (motorista policial). Battisti foi, ainda, condenado como coautor do assassinato do açougueiro Lino Sabbadin e como partícipe da execução do joalheiro Pierluigi Torregiani.

Battisti disparou e matou Santoro em 6 de junho de 1978. Depois desse crime, ganhou férias do PAC. Foi aproveitar as praias da Sardenha na companhia da namorada, Maria Cecilia Barbetta, e de outros companheiros. Maria Cecilia, formada em filosofia e associada ao PAC, prestou impressionante depoimento em juízo, em maio de 1982: “Battisti revelou-me como era o sentimento quando se matava uma pessoa. Ele se referia ao homicídio de Santoro”. Condenada por participar do PAC e se declarando desassociada, ela cumpriu três anos de cárcere e hoje ensina história na Universidade de Verona.

Battisti também matou, em 19 de abril de 1979, o jovem motorista policial Andrea Campana, quando este saía da casa da noiva. Pouco antes, em 16 de fevereiro do mesmo ano, Battisti, na companhia de Diego Giacomini, e com Paola Filippi ao volante do automóvel para garantir a fuga, foi coautor no assassinato do açougueiro Sabbadin. Para despistar e atrair Sabbadin, os assassinos fingiram ser do serviço público de higiene. Coube a Giacomini realizar os disparos, com Battisti a dar cobertura.
Giacomini, no processo criminal, confessou aos integrantes leigos do Tribunal do Júri de Milão: “No que toca ao assassinato de Sabbadin, depois de um atento exame de consciência, devo dizer que fui o autor dos disparos e estava com um companheiro de organização”. Era Battisti, como revelado pelas demais provas. Nesse mesmo 19 de abril, os membros do PAC tinham deliberado consumar duas execuções simultâneas, para impressionar. Assim, um segundo grupo, com Giuseppe Memeo e Gabrielle Grimaldi no papel de executores materiais, eliminou o joalheiro Pierluigi Torregiani, com estabelecimento na periferia noroeste de Milão.

Interessante a revelação de Giacomini, sempre nos autos e em audiência pública, sobre o que se pensava no PAC e que levou à constituição de um grupo de extermínio de comerciantes com Battisti como integrante. Eram selecionados, por leitura de jornais, os comerciantes que tinham reagido a assaltos. Casos do açougueiro Sabbadin e do joalheiro Torregiani: “Nós considerávamos o ladrão um proletário que, como nós, não conseguia emprego e não tinha outro meio para obter um rendimento”. Daí a eliminação dos comerciantes, que eram chamados de “porcos” e “agentes do capitalismo”.

O principal ideólogo do PAC era Arrigo Cavallina, fundador da organização juntamente com Luigi Bergamin e Pietro Mutti. Ambos se desassociaram do PAC e das várias organizações eversivas que integraram depois. Como explicou Giancarlo Caselli, em entrevista a CartaCapital, bastava enviar a juízo a comunicação, sem necessidade de advogado e em qualquer papel. E o desassociado, sem precisar delatar ninguém, recebia um desconto da pena.

Com efeito, Cavallina, condenado à pena de 22 anos pelo homicídio do carcereiro Santoro e por outros delitos, foi o primeiro dos chamados terroristas a se desassociar: à época, não havia esse tipo legal e as condenações foram pelos crimes estabelecidos no Código Penal. Ele se declarou, no processo, responsável por ter feito de Battisti um assassino: “Antes disso tudo, ele era um ladrão comum. Nos conhecemos no cárcere de Udine, em 1977”. Cavallina cumpriu 12 anos de cadeia em razão do abatimento pela desassociação. Deixou o cárcere em 1993. Atualmente trabalha numa associação chamada A Fraternidade.

Luigi Bergamin, outro dos ideólogos, recebeu a pena de 27 anos de reclusão, em face dos homicídios do açougueiro Sabbadin e do motorista policial Campagna. Admitiu os crimes imputados e também desassociou-se da luta armada. Na sentença, ficou consignado que ele “não tinha a mesma fúria sanguinária de Battisti”. Bergamin, formado em economia e direito, é hoje professor em uma escola profissionalizante de Milão. Diego Giacomini é outro desassociado. Recebeu a pena de 15 anos. Preso em 1979, deixou a prisão em 1989. Trabalha, atualmente, numa cooperativa em Padova. Quando integrante do PAC, Giacomini era noivo de Paola Filippi, a motorista da fuga do açougue, que, condenada à pena de 23 anos, fugiu para Paris, onde tem cidadania francesa. Casada com cidadão francês e com um filho lá nascido, ela teve a extradição negada.

Quando da prisão, a 26 de junho de 1979, Battisti estava escondido no apartamento de Silvana Marelli, onde foram apreendidos uma bomba, cinco pistolas automáticas e um fuzil. Como Battisti ainda era considerado um membro da linha militar da luta armada, Mutti promoveu o seu resgate da penitenciária de Frosinone, em 1981. Mutti era operário da Alfa Romeu. Foi preso em 24 de janeiro de 1982. Cumpriu, depois de se desassociar, oito anos de prisão. Ao contrário do sustentado pelos admiradores de Battisti, Mutti não recebe remuneração por ter se arrependido. Também não mudou de identidade. Trabalha como operário e recebe pouco mais de mil euros mensais de salário. Frise-se, não delatou em troca de liberdade, como irresponsavelmente se propalou no Brasil. Ele cumpriu pena de oito anos.

Sante Fantone, que usou o próprio automóvel (a placa foi anotada por uma testemunha), teve crise de consciência, pois não se conformava com os assassinatos. Tornou-se, como Mutti, um desassociado e, depois, colaborador de Justiça. Preso em 1984 e condenado à pena de 12 anos e meio de reclusão, deixou o cárcere em junho de 1990. Fantone vive na Sicília e está inválido em razão de um acidente. Confirmou, em relatos, toda a estrutura e como foram as ações do PAC e os envolvidos. Sobre a atuação de Battisti em assassinatos, contou tudo, com detalhes que lhe foram revelados pelo próprio Battisti.

Giuseppe Memeo, que acompanhou Battisti na execução do motorista policial Campagna, também se desassociou. Condenado à pena de 30 anos de reclusão e preso em julho de 1979, deixou o cárcere depois de cumprir dez anos da pena. Trabalha num grupo de assistência a portadores de HIV. Memeo admitiu ter participado do assassinato de Campagna, mas frisou que os disparos foram feitos pelo seu acompanhante. Quem seria senão Battisti, conforme revelado pelas provas? Um ponto a mais: Sante contou ter estado na casa de Roberto Veronese e, no armário, apanhou uma jaqueta de frio. Então, Veronese o aconselhou a não usá-la: “Era a jaqueta usada por Battisti no dia do assassinato de Campagna”, disse Veronese.

A incriminar Battisti existem, ainda, as confissões de Valerio Caval-loni e Massimo Tirelli, todas a confirmar os outros relatos e as acusações feitas pelos juízes de instrução Pietro Forno, Giuliano Turone, Armando Spataro (definiu Battisti como assassino da pior espécie), Guido Salvini e Luigi Liguori.

Como se nota, a nova mistificação colocada na praça e voltada a influenciar o presidente Lula não resiste ao simples exame dos autos processuais. É dispensável falar, pois não foi objeto do pedido de extradição feito pela Itália ao Brasil, do processo em que Battisti e Roberto Silvi tentaram matar o médico Diego Fava. A pistola de Battisti falhou e Silvi teve de fazer os disparos. O médico, embora ferido, sobreviveu.


Wálter Maierovitch

Walter Maierovitch é jurista e professor, foi desembargador no TJ-SP

2 comentários:

  1. Arre égua!quanta podridão,não já chega os genocidas que temos aqui?.Que o sangue destas vitimas caia sobre a cabeça de lula, e todos aqueles que apoiarem este lixo humano.

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  2. Antes o Lula queria importar uma prostituta do Irã para o Brasil,como se aqui não tivesse o bastante.Agora querem segurar um bandido por culpa do Lula tambem,como se aqui já não tivesse o suficiente. Agora o referido amarelou,com medo de ir a Itália e sofrer algum atentado.Poderia pelo menos ter deixado o nome do Brasil fora disso,mas, não se contentou pois como se diz por aí,fala bem de improviso (não pensa),por que não sabe ler direito e por isso quase afundou a Nação Só não o fez por o Brasil é forte e se os políticos deixarem ou não atrapalharem logo será do Primeiro Mundo tambem.

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